O especialista Rodrigo Balassiano informa que a Instrução CVM nº 175 representa uma profunda reformulação no marco regulatório dos fundos de investimento no Brasil. Ao consolidar e modernizar regras, a norma busca conferir maior eficiência, transparência e segurança jurídica ao setor. Contudo, no contexto específico dos fundos de venture capital (VC) e das startups, surgem dúvidas sobre sua efetividade em atender às peculiaridades e necessidades desse segmento dinâmico e de alto risco.
A ICVM 175 oferece flexibilidade suficiente para fundos de venture capital?
Embora a ICVM 175 traga avanços importantes, como a padronização da estrutura de classes e cotas nos fundos, a sua aplicação a fundos de VC ainda enfrenta limitações. Os investimentos em startups demandam agilidade, liberdade contratual e modelos de governança menos engessados, características que muitas vezes se chocam com a rigidez regulatória tradicional. A norma ainda exige uma série de obrigações formais que podem limitar a operação eficiente de fundos com foco em inovação e risco elevado.
De acordo com Rodrigo Balassiano, outro ponto relevante é que os fundos de VC frequentemente investem em empresas em estágio inicial, com estruturas societárias pouco convencionais e práticas contábeis menos robustas. A ICVM 175, ao buscar uniformizar os requisitos para os diversos tipos de fundos, pode não distinguir essas especificidades. Isso pode gerar insegurança ou desincentivar gestoras que atuam nesse setor, exigindo delas uma adaptação que nem sempre é compatível com a realidade das startups.
A governança prevista na ICVM 175 favorece a inovação?
A governança é um pilar fundamental para a proteção dos cotistas, e a ICVM 175 procura reforçar esse aspecto. Mas, ao aplicar padrões mais rígidos e uniformes a todos os fundos, inclusive os de venture capital, a norma pode comprometer a maleabilidade necessária para decisões rápidas e negociações complexas típicas do ambiente de startups. A exigência de políticas formais, auditorias frequentes e controles internos estruturados encarece a operação e pode reduzir a atratividade para alguns gestores.
Ademais, startups muitas vezes operam em ambientes altamente voláteis e inovadores, onde o risco é parte do modelo de negócios. Rodrigo Balassiano frisa que fundos que atuam nesse universo precisam de liberdade para estabelecer critérios próprios de diligência, avaliação e monitoramento. A padronização imposta pela ICVM 175 pode limitar a adoção de práticas inovadoras de governança que seriam mais eficazes nesse contexto, afastando investidores com apetite por risco e foco em disrupção.

A norma é eficaz para atrair capital e fomentar o ecossistema de startups?
Um dos grandes desafios do ecossistema de startups no Brasil é atrair capital qualificado em volume suficiente. A ICVM 175 ainda não resolve obstáculos importantes como a insegurança jurídica sobre estruturas híbridas e a dificuldade de compatibilizar o modelo regulatório com os interesses de investidores institucionais. A norma pode até aumentar a transparência, mas sua complexidade operacional pode espantar players menores ou estrangeiros menos familiarizados com o sistema brasileiro.
Rodrigo Balassiano evidencia que para que o ambiente regulatório seja verdadeiramente catalisador de inovação, é necessário que ele vá além da rigidez e abrace uma abordagem baseada em princípios, com margens para soluções contratuais criativas. Embora a ICVM 175 avance em alguns aspectos, como a possibilidade de classes de cotas com direitos distintos, ela ainda parece pautada por uma visão conservadora, mais adequada a fundos tradicionais do que aos modelos ágeis e experimentais que o venture capital exige.
Oportunidade de ajuste para fortalecer a inovação
A ICVM 175 representa um marco importante para o mercado de capitais, promovendo a modernização e a organização do regime dos fundos de investimento. No entanto, sua aplicação aos fundos de venture capital e às startups ainda apresenta lacunas e desafios. Ao buscar uniformidade, a norma pode acabar engessando um setor que prospera justamente pela flexibilidade e pela capacidade de adaptação rápida.
Por isso Rodrigo Balassiano conclui que é necessário que o regulador continue dialogando com o ecossistema de inovação para ajustar dispositivos e criar exceções ou regimes especiais que contemplem a realidade dos fundos de VC. A promoção de um ambiente regulatório mais aberto à experimentação e ao risco é essencial para que o Brasil se torne um polo competitivo no financiamento de startups. A ICVM 175 deu passos importantes, mas ainda precisa evoluir para atender plenamente esse setor estratégico.
Autor: Nikolay Sokolov